O ATO DE ACOLHER E A COLETA DE AFETOS
Quase a temer ou a abrir os olhos, quando escutamos alguém identificar seu local de trabalho como "instituição". Aí, desconfie que a missão e propósito de vida podem estar à beira da traição ou do mero exercício da função.
Passei bons tempos de minha vida profissional , falando e praticando a abordagem anti-institucional, devido à frieza técnica que notava em antigos prontuários de Serviço Social. Linguagem que projetava o preconceito de superioridade sobre os atendidos. Longe do espírito do Serviço Público ou das doações pagas através dos impostos. Espírito ou mística que sintonizam-se com o mandamento de Jesus para servir como Ele com gestos de amor para uma vida plena (Jô.10:10)
Preciso contar que, na gestão das Aldeias Infantis SOS Brasil, tanto em Brasília, quanto em Manaus, durante 26 anos, os critérios fundamentais de seleção (RH) eram a capacidade de empatia, a habilidade de ser agente de mudanças e a solução de problemas. Daí, a formação continuada, as avaliações de competências e os planos de desenvolvimento pessoal.
Os gestos mais simples eram decisivos para colher afeto no cotidiano. Saudar sorrindo, explicitar que está feliz em encontrar, perguntar o que deseja e de forma gentil, "como posso ajudar, ”entre outros: perguntar se quer água, oferecer uma cadeira, dedicar-se ao momento ou pedir desculpas sinceras quando, no momento, for impossível servir.
Nesses 7 meses de aposentado e de ter deixado a gestão da Equipe Técnica das Aldeias, foi tempo suficiente para admirar o bom trato que as assistentes sociais, psicólogas, administrativos e colaboradores das Aldeias prestavam, indistintamente, a todos e todas que os procurassem. A assertividade, autenticidade e empatia eram dosadas em cada relação.
Por outro lado, andando pelo "mundo a fora", extramuros, como me identifico, tenho notado um certo ranço institucional que talvez tenha cooptado a afetividade de bons profissionais. Qualquer crítico, em sã consciência, chega a pensar no ditado bíblico:
"Porque, se eles fazem isto ao lenho verde, que acontecerá ao seco? (Lucas 23:31). Se parceiros profissionais são pouco atendidos, imaginemos os usuários. Não creio que sejam maltratados!
Quando dizemos "coleta de afeto" não estamos poetizando, mas conferindo o resultado do amor que gera amor, autoconhecimento e protagonismo. A perspectiva técnica de quem acolhe e ouve é semelhante a um jardim que floresce porque não faltam chuvas e todo um clima de relacionamento e mútua confiança.
Para a frieza impessoal ou numérica das senhas, ninguém vale com sua individualidade. Segue o roteiro de forma universal que desconhece cada usuário como pessoa única. A mesma rota é que o usuário não me venha com problemas porque estamos aqui para fazer normas e mais normas a fim de que a "zona de conforto permaneça, a paz de cemitério aconteça e que nada me aborreça". Cria-se um emaranhado de dificuldades com as leis e imposições para enquadrar numa forma única as diversidades. Um verdadeiro cipoal de negatividades na contramão dos princípios tão humanos e evangélicos.
Para colheita dos direitos das populações vulneráveis e para ampliar parceiros aplica- se o que S. Paulo escrevera aos Coríntios : "O amor é paciente, o amor é bondoso...Não maltrata, não procura seus interesses, não se alegra com a verdade. Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta". (1Cor. 13,4ss)
E nada deixa para o dia seguinte, se pode fazer hoje. Muito básico, indicativo de um serviço público civilizatório, coerente com a utopia de crescente humanização.
O que constatamos de perversão em alguns servidores públicos ou colaboradores das Organizações da Sociedade Civil, não podemos atribuir às falhas de formação acadêmica, mas de ausência de educação familiar entre outros motivos.
São sempre bem vindos os Conselhos Regionais quando cumprem seu papel de fiscalização da prestação de serviços da categoria, centrando-se na exigência de um acolhimento e atendimento de quem está em busca de algum serviço ou encaminhamento.
Colher afeto , no coração das organizações da sociedade civil e do Estado , ocorre quando se antecede o acolhimento empático, transparente que não tem nada a esconder.
Assim acontecendo no funcionalismo, estaremos empatando com o comércio das trocas que geram lucros, mas que recebe cada cliente como pessoa, no mínimo, consumidora leal e bem atendida.
Por uma sociedade civil e educada, colhendo frutos e afetos, "deixando um pouco de perfume nas mãos que oferecem rosas". (NP)
Obs. A foto: flor acolhida pela folha é cedida pelo amigo Júlio Afonso Mesquita.
Meu amigo, parabéns pelo texto.
Meu amigo querido, concordo plenamente com tudo aqui explicitado. Acolher é amar como Jesus tem nos ensinado a mais de 2000 anos, é cuidar como gostamos de ser cuidado, é educar com amor e desvelo. Abraços fraternos